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"Minha Idade Não É um Elogio"
Alguém me disse: “Nossa, você está tão bem… pela sua idade.”
Sorri, agradeci, mas a frase bateu em mim como um elogio que carrega arestas.
Porque, no fundo, o que se esconde ali?
A surpresa de que o tempo não me engoliu inteira?
A expectativa de que eu deveria ter sucumbido à ideia de que envelhecer é um crime?
Estou bem, sim.
Bem com cada ruga que teima em surgir, como um rio cavando seu próprio caminho.
Bem com as marcas de expressão que contam histórias, algumas de risos que doíam na alma, outras de silêncios que dobravam o corpo.
Meu rosto não é um erro a ser corrigido, é um espelho.
Nele, vejo noites sem dormir, manhãs de coragem, tardes de dúvidas e anos de aprendizado a ferro e fogo.
A mulher tem o direito de envelhecer em paz.
Sem que cada linha no rosto seja tratada como um sinal de alerta.
Sem que a passagem do tempo seja medida em comparação com a eterna juventude — essa miragem que ninguém alcança, mas todos cobram.
Minha idade não é um troféu, mas também não é uma vergonha.
É simplesmente o que sou:
uma coleção de dias vividos, cicatrizes honradas, amores que deixaram marcas e lutas que moldaram meu olhar.
Não me peçam para esconder o que o sol testemunhou, o que as lágrimas lavaram ou o que os abraços aqueceram.
Envelhecer não é fracassar em ser jovem, é sobreviver para contar a própria história.
E hoje, quando o espelho me devolve essa mulher de cabelos grisalho e pele marcada,
respondo àquele elogio cheio de “apesar de”:
“Não estou bem pela minha idade. Estou bem com ela.”
Afinal, cada ruga é uma palavra não dita, cada fio grisalho, um verso de resistência.
E eu?
Sou um poema em constante revisão,
livre para envelhecer sem pedir licença.
(Um manifesto silencioso para quem insiste em existir além dos espelhos que aprisionam.)
@aurorazanco_escritora
Vida de Mulher